Tenho 51 anos de idade, 33 dos quais vividos com uma participação cívica muito intensa, pós 25 de Abril de 1974. Faço este enquadramento para dizer ao leitor que começo a duvidar seriamente de que a minha geração (que coincide com a de muitos políticos no activo) consiga cumprir os objectivos que se impõem a um efectivo desenvolvimento sustentado do país, se não se adoptarem estratégias de acordo com os novos desafios e oportunidades, sustentadas numa clara visão de futuro.
Em resultado do Conselho Europeu de Lisboa de 2000, a União Europeia (então dos 15) definiu, como objectivo estratégico para 2010, «tornar-se a economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social e respeito pelo ambiente».
Decorridos 7 anos, o balanço para Portugal não é muito animador.
Enquanto jovem, vi muitos amigos meus terem necessidade de emigrar na procura de melhores oportunidades que o país não lhes conseguiu dar.
Com o decorrer dos anos, houve pequenos períodos em que quase me convenci de que este fenómeno estava a abrandar (talvez pelo efeito da chegada dos fundos comunitários), mas na realidade não abrandou.
A procura dos destinos tradicionais – França, Luxemburgo, Suíça e seus vizinhos continua a verificar-se, mas não só. Actualmente, há milhares de portugueses na agricultura em Espanha, a criar perus em Inglaterra, galinhas na Irlanda e uma nova vaga a preferir Angola. Há também o elevado número de trabalhadores que semanalmente se deslocam em carrinhas para trabalhar na construção civil em Espanha e que não contam para as estatísticas.
Segundo um estudo recente do Instituto Nacional de Estatística, a lista dos países procurados pelos portugueses é liderada pela Espanha, seguindo-se o Reino Unido e Angola.
Houve momentos em quase fui levado a acreditar que os que partiam eram em grande parte os que tinham poucas habilitações (maioritariamente, mão-de-obra pouco qualificada).
Mas afinal muitos dos que continuam a partir têm cursos superiores e outros mesmo procuram lá o tal diploma.
Dos jovens portugueses que se formam em algumas das melhores universidades dos Estados Unidos da América, estima-se que regressam ao país, após a conclusão do curso, apenas entre 10 e 20%.
De acordo um relatório do Banco Mundial (BM), um quinto dos portugueses com ensino superior não trabalha no país.
Portugal é mesmo o país europeu de média/grande dimensão mais afectado pela saída de licenciados e quadros técnicos. Na lista dos estados com mais de cinco milhões de habitantes, Portugal é o 21º com a mais elevada percentagem de licenciados a residir fora do país.
Convém salientar que, se Portugal está a perder licenciados e quadros qualificados para países estrangeiros, concelhos como o de Coruche perdem ainda, ao nível do país, na “luta” interior/litoral. Em muitos casos, perde população jovem, ainda enquanto estudante, logo após o 9º ano, por uma manifesta ausência de percursos escolares.
Esta situação tenderá a agravar ainda mais a estrutura demográfica envelhecida do Concelho, com efeitos perversos no curto e médio prazo.
Para as regiões que sofrem duplamente destes efeitos negativos, o desafio é enorme, pois sem “estancar” a saída das pessoas, dos quadros qualificados, é difícil contrariar esta realidade.
Há que inverter esta situação, sob pena de, mais tarde, serem também os pais a ir ao encontro dos filhos.
São necessárias medidas criativas que favoreçam a fixação de casais jovens no concelho, ao nível da intervenção social, da habitação e do emprego qualificado.
As assimetrias de desenvolvimento interior/litoral e Portugal/média dos países mais desenvolvidos só poderão ser combatidas com êxito se os investimentos estratégicos, designadamente os do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN 2007-2013), forem efectivamente aplicados de forma mais selectiva do que até aqui tem acontecido…
A estratégia decidida em Lisboa em 2000 continua a ser fundamentalmente relevante. Contudo, importa rectificar o que correu mal e desenvolver as políticas e os projectos estratégicos mais conducentes ao cumprimento dos seus objectivos.
Também a nível local e regional nem sempre os fundos da União Europeia e Nacionais têm servido para construir as infra-estruturas que permitiriam desenvolver as regiões mais atrasadas. Há que alterar esta situação e canalizar parte significativa dos investimentos para projectos verdadeiramente indutores dum efectivo desenvolvimento sustentado.
Para tal, é preciso que se assuma, claramente, como grande desígnio estratégico, a qualificação dos seus cidadãos, valorizando o conhecimento, a cidadania, a inovação e o empreendedorismo, bem como a promoção de níveis elevados e sustentados de desenvolvimento económico, coesão social e qualidade de vida.
NOTA:
Sem investimentos adequados, sem pessoas cada vez mais qualificadas, sem massa crítica que nos diferentes domínios de participação económica, social, cultural e política possam fazer a diferença, não será possível obter os contributos para as mudanças qualitativas que se desejam. |